segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Aos da janela

E você achando que as minhas opções eram muitas. Entre o ronco da barriga e o sol bravio não existem tantas opções. Aos que da janela observam a chuva cair, não imaginam como ela pode amolecer pedras e rochas. Não me uso como exemplo, minha vida não é para essa serventia. Não gosto de ser visto como primeiro degrau da degradação humana, por isso a minha voz só é ouvida dentro de mim. De fora sou no máximo silêncio de matagal, se som produz é para lembrar da mudez. Talvez é que mais aprendi dentro de uma mina de carvão. Apesar de em vários momentos acreditar que a fé se enterrava a cada golpe de fumaça negra, também sabia que era abaixo da terra, encubadora de sementes, que buscava minha salvação. Não me faz graça contar sobre o único trabalho disponível a mim naqueles tempos, mas só depois descobri que havia tornado-me escravo. O trabalho de certa forma era involuntário e forçado: apesar de meu corpo transitar negro, nunca me percebi cativo. Isso só aconteceu quando meus pés fugiram. Não suportaram sustentar a dor de um corpo renegado. Não só fugi da mina, fugi de mim mesmo e busquei abrigo no Rio de Janeiro. Mas, com licença, desço aqui. 

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