domingo, 29 de dezembro de 2013

Os anteriores

Eles pedem para amarmos o próximo, por que não fomos capazes de amar os anteriores?

sábado, 28 de dezembro de 2013

Pardal

Dizem que escrever não vale a pena. Pena tem diversos sentidos: a julgar, a acovardar e a voar. Fico com esta, continuo me espelhando nos pardais, cantam por dentro para não pegarem pena, não a mesma pena que usam para se libertar. Valem as penas para quem as sabe usar, é um dos provérbios dos pequenos pardais.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

La sonrisa

Acredito como um passarinho, piamente, que a máquina fotográfica não foi inventada somente para refrigerar momentos, mas, afortunadamente, para descongelar sorrisos. Por que então o magicômico pedido de "sorria"?

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Ataúde

Que alguns escutassem o escorregar da chuva ou cheirassem-na depois de despida no asfalto, acredito; mas a mim isso desabastecia. Precisava te-lha. Subi em escada e retirei uma telha colonial, daquelas que dizem que eram feitas das coxas dos escravos, como se nos tempos coloniais já se fizessem homens-máquinas de hoje em dias. Quando meu filho chegou para me invisitar, porque pareço desaparecer depois de velho aos que não dei luz, mas alumiei com minha lampalinda, assim sendo fui eu que dei a segunda luz a ele, disse em vozes de criança autoritária que haveria de providenciar a compra e alocação da telha. Desinsistiu no dia seguinte, naquele em que não estava mais em casa, o visitável nunca é boa companhia para quem tem outros assuntos a tomar de conta ou fingir de conta. Os escravos de outrora que se descaçassem do trabalho árduo de ser forma de telhas. Outra invisita me fez esse ano para perguntar sobre a cobertura, foi aí que lhe disse.
- Desde que sua mãe se foi a comunicar somente com mortos, não diferente de ti que se comunica com outros mortos, deixei a casa reflorescer, reflorestar. A água que lhe cai, não goteja, mas escorre pelo caule das paredes até a raiz. Desse modo, injetei e enjeitei vida ao meu ataúde, encovado que havia vivido até agora.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Sorrir e chorar

Insistiu-se: pode-se chorar de felicidade, mas nunca rir de tristeza.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Entre passos e caminhadas

Não se sabe o caminho aquele que não deu o primeiro passo, disse o pai aos filhos, enquanto servia-se de veículo. Logo em seguida, pensou mas não disse: e a vocês, que cujas peles negras despertam as mais duvidosas inclusões e inconclusões, o primeiro passo já é uma caminhada.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Crianças aposentadas

Já existem aqueles que conseguem ver além e positivamente a desertificação/desafeição, o chamado darwinismo urbanístico, das metrópoles: com os cactos em frente de casa, as crianças aposentam por idades que não precisam mais ter. Chuteiras de repente dependuradas.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Resposta entre-aberta a Edward Snowden

Resposta entreaberta a Edward Snowden

Querido amigo Snowden,
Despreocupa-se comigo. Moro nesta janela taipada. Aqui nenhum vem me visitar, faço parte de uma comunidade solitária, de tradições bem brasileiras: me desestatístico. 
Sinto saudades de quando me vigiavam o governo estadunidense. Sou carente de preocupações governamentais. 
Se quiser passar por aqui em casa, bata na janela e tomamos um café. 

Atenciosamente.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Sobre pescadores

Criamos escolas não para prendermos crianças,  mas a nós mesmos. Nossa luz é fosca, produzimos lusco-fusco , nenhuma lua por mais que cheia, grávida, não apetece aos enfantes. Não ensinamos nada a ninguém. Na verdade se não tirarmos a liberdade daqueles que nos fitam, sem entender quantas desgraças nos aconteceram para nos culpar por sermos o que somos,  sem escravizá-los com historias de um brasil ou do triângulo retângulo ou do sujeito subordinado, nunca teríamos a capacidade de nos vermos como pescadores, daqueles que pescam só para ter o poder de soltar. Nas canoas nenhum peixe reconhece o esforço do pescador. Criamos escola para que a chamada seja respondida paternalisticamente: presente, senhor, assim como quando os escravos faziam à frente da Casa-Grande para receber as dádivas de seu bom senhor.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Escada

Não gostava de metáforas, por isso não acreditava que sua vida era apenas uma escada progressiva e evolutiva (e) não gostava de escadas, por isso não acreditava que sua vida era apenas uma metáfora progressiva e evolutiva.

Guarda-chuva

Aguardo-chuva. Como o mais religioso ateu espera Deus, aguardo a aguada-chuva. Chuvaexu, que sse não for pedida a permissão quando chega-chuva, capaz é diluviar; mas com sincera licença,  desanuviar. Casa medingante é que carrega mendigo: afugento-me dos guardas, abrigo-me em guarda-chuva. 

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Apóstolo graduado

Deixa-me ver se entendi, está me dizendo que os africanos habitam o Brasil, Sim, que dificuldades estas a encontrar nisso, Aqui é a África, Quem lho disse, Os livros, a escola, todo o mundo, Estão errados, por aqui não se encontra nenhuma África, Está no mapa, vocês foram escravizados para o Brasil, Vejo realmente que és analfabeto, Como se sou apóstolo graduado, daqueles que se santificam a si mesmo, Digo de outras línguas, não consegue ler uma pessoa, As pessoas não são livros, Talvez por isso ache que aqui existam pessoas a sofrer, a comer terra e beber pingo d'água, Só me resta dizer-me que não é negro, Nunca vi um por aqui.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Construo pequenas ruínas

- Que estás a fazer?
- Sou mestre de obras. Construo pequenas ruínas, as que cabem nas palmas das minhas mãos.
A todos que passavam esta era a resposta dada em pensamento às perguntas imaginárias de transeuntes. Poucos têm a coragem de tornar falado aquilo que expressavam em mente e em gestos. Aquele homem, pelo contrário do que fazem os artesãos das pedras, não estava a retirar os restos pedregulhos, colocava-os assim imperfeitos em seus lugares de origem. O cimento é como papel, aceita que lhe deem forma, falou por fim. Acrescentou ainda, cansei de acobertar a terra, a mesma que regenera o passado, a única que transforma a morte em vida.

Das neves do pólo norte

De súbito, sentou-se a mais nova representante das neves do pólo norte, e também dos varejistas, menina graciosa de pernas à mostra. Disse que eleita democraticamente ao trono, necessitava "agregar valor", inexpressão da moda, aos novos empreendimentos lojísticos, lógico está. Papai, mais para vovô, não conseguia nem mesmo trair os petites enfantes, para que seus pais comprassem presentes, a forma justamente mais paternal de se dizerem ausentes.

Toca-discos

De quantas necessidades se inventam uma felicidade? Se questionou ao passar por destroços civilizacionais, mais conhecidos sob a alcunha de tecnologias. Infinitas, diria seu pai se para ele fosse a pergunta. Ainda não tinha reparado que levava a tira colo seu mais novo escutador de música, tão perto e tão distante daquele toca-discos.

O que seria liberdade?

Pensou nos escravos do 13 de maio, pensou em si: o que seria a liberdade? Fechou o caderno depois de autorizado a sair.

Ciúmes de alcóol

O álcool mata de ciúmes, essa conclusão cheguei. Não o faça de amante, de cama quente, pois ao parar de beber, como a cobra que sibila e tateia o ar com sua língua, deixará a consumir-te.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Até Deus queria esquecer-se daquele lugar

Dona Nininha tinha mais a reclamar da falência da Igreja do que, propriamente, da falência múltipla dos órgãos que acometeu seu falecido marido. Como todos os mortos que nunca deixam de estar presentes, a Igreja estava lá para quem passasse sinal da cruz fizesse, não em respeito, mas como assombração. Repetia-se, como ainda agora, que aquele terreno não era fértil nem para tubérculos, esta última palavra Dona Nininha não pronunciou, somente teria dito "nem pra batata essa terra serve", mas como estamos lidando com leitores dos mais graduados que se tem notícia, apesar de em nenhum país do mundo ouvir-se falar em universidade brasileira que preste mais do que poste sem luz, vale a substituição das suas palavras, uma vez que causaria espanto dos mais engravatados aos mais socialistas-leninistas que estivessem a tatear conversa com ela, os erros de português poderiam formar uma outra língua, que obviamente não reconhecida por tão distintos senhores das letras. De volta à narrativa, se é que assim a podemos chamar, Dona Nininha sabia mais do que ninguém, nesse caso saber mais do que ninguém é o mesmo que saber o que todos já sabiam, que aquele terreno, aquele pequeno terrário, havia sido um bar, coisa mundana, este adjetivo peculiarmente cravado para hierarquizar pessoas e lugares não frequentados pelos não-mundanos de sua religião. Sua experiência na sétima arte de berita, dizia que espíritos de outros mundos, mundanos ou não-mundanos, visitavam homens que naquele bar bebericavam, transmutando-os em boçais, dizendo línguas de não se sabe onde, atacando mulheres e filhos. Sabia desde por sua bisavó, que não era bom sinal casar com sinuqueiro. Mas resignava-se aos tapas que lhe estalavam o rosto, quando criança, adolescente e esposa. O som das chibatas é que amedrontavam escravos, afirmava sua avó: nunca mais esqueceu do som de uma tapada. Não foram poucos moisés que tentaram separar aquele mar vermelho, vermelho sangue que havia queimado naquelas terras, ou daquelas terras nascidas. Por fim, Doninha, apelido que recebera pela junção de duas palavras, estava certa, até Deus queria esquecer-se daquele lugar. 

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

De meus antes-e-entes-passados


Desnecessário arrolar todo o processo pelo qual hoje encontramo-nos, especialistas, alguns autointitulados outros contra-indicados, já não descansam mais suas mandíbulas de explicá-lo, seja empiricamente, seja teoricamente, como o sistema educativo, pós-interativo, dos anos áureos e auríferos da internet e livros em tábuas (famosos pelo anglicanismo estrangeirista "tablets"), aos poucos ou rapidamente, dependendo da linha proposta pelo intelectual da vez, foi morfando, almofadando, aprisionando aqueles conhecidos pela alcunha de estudantes, ou num português mais gerencial, educandos. Esta dúvida, não opõe ninguém, desde os apósgraduados aos nemgraduados: as bastilhas é que engravidaram e abortaram, e não pariram, tudo o que nos acomete. De fato, não precisaria de tantas linhas para dizer apenas que mingou-se alunos dispostos ao autoexílio escolar, ou como se zombava, detentos de regime semi-aberto, entretanto, ao inverso, anoitecia-se em casa e apresava-se ao dia. Mingou-se até secar-se, esse sim rapidamente feito poça d'água em terra de sertanejo, até que se achou uma nova serventia para os presídios-escolas, aterro sanitário ou lixão nas más e boas línguas. Lixo, esse sim era bom cárcere-privado, ou público, ou ainda privada. Não me comprometo mais em deslindar o destino dos chamados educandos, aqui já vai mais do que permite um usuário dependente de rede social ler. Como vestígio ou prova, se bem que a provar estou isento, só sobrou e soçobrou esta foto de meus antes-e-entes-passados.